O pequeno escritor

                                                                                          Leni David

 O telefone tocou. A avó respondeu; do outro lado da linha, de outra cidade, Nino,  um menino de oito anos:

– Alô? Vó?… é você?

-Sou eu sim, meu amor! Que boa surpresa! Sua mãe está em casa? Quem discou o meu número pra você?

– Ninguém, Vó, eu mesmo disquei.

– Que bom, Nino, agora a gente vai poder conversar com mais freqüência; você já sabe telefonar sozinho! Quais são as novidades? Você está bem?

– Tudo bem, Vó. Eu aprendi a telefonar e liguei pra lhe contar uma novidade.

– Novidade? Que novidade é essa? Então quero ouvir…

– Eu agora sou escritor, Vó; escrevi um livro!

Controlando o riso, a avó deu continuidade ao diálogo:

– Você escritor? Que maravilha!

-É Vó, eu escrevi um livro; escrevi a história de um menino que voou num balão de papel.

E a avó com os olhos marejados, arriscou outra pergunta:

– E como é essa história? Posso saber? Você me conta?

– Conto, sim, espera um pouquinho que eu vou sentar:

“Era uma vez um menino chamado Pedrinho; ele queria passear, mas ele não podia, porque o pai e a mãe dele estavam trabalhando. Ele então foi para o quarto e ficou desenhando. Aí ele desenhou um balão bem bonito, bem colorido e que voava pelas nuvens. De lá de cima ele via o mar, a terra e as árvores, os carros bem pequenininhos. Aí um bando de passarinhos começou a voar junto dele e a fazer cambalhotas no ar. Era engraçado (risos).

O vento sacudia o balão pra lá e pra cá. Todo mundo se divertia, quando de repente apareceu uma nuvem muito escura. Pedrinho ficou com medo e começou a chorar. Os pingos de chuva começaram a cair e a molhar o balão de papel de seda. Ele achou que nunca mais ia poder ver os seus pais.

Foi aí que os passarinhos ficaram com pena do menino. Enquanto o balão murchava os passarinhos, com seus bicos, agarram na camiseta e no short de Pedrinho e trouxeram ele para casa. Quando ele abriu os olhos viu que estava deitado na cama e que estava tudo bem, mas ainda continuava chovendo. Ele conseguiu se salvar”. Ainda bem, não é Vó?

Silenciosa a avó sentia as lágrimas que escorriam pelas faces, quase sem conseguir falar, quando a vozinha, do outro lado da linha, replicou:

– Vó, você está aí? Você ouviu a minha história?

Com a voz embargada quase sussurrando, a avó respondeu:

– Ouvi, sim, querido; sua história é muito bonita. Eu adorei! Você guardou o papel onde escreveu a história?

– Não Vó, eu fiz um livro. Foi assim: eu escrevi a história ontem; dobrei o papel ofício que eu peguei no gabinete da minha mãe, grampeei e fiz um livro; fiz um desenho bem bonito na capa e escrevi o meu nome.

– E cadê o livro, você guardou? Perguntou a avó, ansiosa.

– Não, Vó, eu vendi!

Entre assustada e incrédula, a avó exclamou:

– Vendeu? A quem? Quem comprou? Eu queria tanto ter esse livro…

E o menino, sem hesitar, explicou:

– Ontem na escola eu contei a história para os meus colegas e todo mundo gostou. Depois eu perguntei se alguém queria comprar o meu livro. Aí então a professora disse que queria e aí eu vendi pra ela.

– Vendeu para a professora? E quanto ela pagou?

– Um Real!

– E o que você fez com o dinheiro?

– Comprei um sorvete de flocos na cantina.

A avó enxugou as gotas que ainda molhavam a face e com a voz trêmula concluiu:

– Obrigada, meu amor, eu amei a história do seu livro! Você é um escritor de verdade.

– De nada, Vó. Eu gosto de escrever; você quer eu escreva outro livro pra você?

E sem esperar a resposta ele concluiu:

– Eu vou escrever. Um beijo Vó, eu te amo!

                         Feira, 28 de junho de 2006.