Evolução do carnaval da Bahia II

 

O carnaval dos afoxés, blocos, cordões e batucadas

                                                           Aurélio Schommer

Data de 1892 a primeira participação de descendentes de africanos no carnaval oficial da Bahia, através dos clubes Embaixada Africana e Pândegos d’África. Incentivada e saudada pela imprensa por conta do “bom comportamento” dos negros, a participação dos clubes africanizados seguia a linha de negar a bagunça do entrudo em nome da ordem dos desfiles. Nem todos os afrodescendentes, porém, podiam participar. Fazer parte de um clube era privilégio de mulatos de classe média.

Os demais afrodescendentes queriam brincar o carnaval a sua maneira, organizando-se em afoxés e “batuques”, como a mídia classificava as músicas tocadas por eles. Em 1905, a Polícia baixa portaria proibindo os “batuques”, fazendo cumpri-la com rigor.

A organização de blocos, cordões e batucadas foi a resposta popular às proibições. Eles desfilavam e promoviam bailes de rua nos bairros periféricos, na Baixa dos Sapateiros e Terreiro de Jesus, longe dos olhos da elite. Passaram a ser tolerados justamente por se distanciarem do centro, a área nobre entre o Campo Grande e a rua Chile, ocupada pelos corsos.

Com o decorrer da primeira metade do século XX, o patrocínio de casas comerciais e das primeiras emissoras de rádio baianas deu gás e aceitação aos blocos, onde o samba e outros ritmos apropriados ao predomínio dos instrumentos de percussão se destacavam como trilha sonora. A tradição chegou até nossos dias a partir deles, sendo os blocos afro e o chamado Carnaval Ouro Negro formas modernas de representar esses antigos carnavais populares.

Se o afoxé é uma tradição muito antiga, é com a criação do Filhos de Gandhi, em 1949, que ganha expressão de público e atrai a curiosidade e, mais adiante, a fidelidade de baianos e visitantes.

A partir dos anos 1970, surgem novos blocos afro, com refinada produção musical e a proposta de resgatar as raízes e o orgulho africanos de nossa gente. O Ilê Ayiê, da Liberdade, é de 1974. Com três mil componentes, 147 deles na bateria, enche as ruas do circuito oficial do carnaval. Mas é o Olodum, fundado em 1979 no Pelourinho, quem irá projetar essa forma de fazer música e carnaval para o mundo.

Foi um sucesso estrondoso, projetou o nome de nossa terra para a aldeia global, fenômeno de rápida disseminação, que contribui enormemente para a atração de turistas.

Logo houve a fusão entre trio e bloco afro, o que gerou novos sucessos, como o Araketu, fundado em 1980. Na medida desse sucesso, a baianidade passa a ser sinônimo de negritude, marca até hoje mantida.

 Aurélio Schommer – É natural de Caxias do Sul – RS (1967), radicado em Salvador desde 1995, é escritor e vice-presidente do Conselho Estadual de Cultura da Bahia. Em 2011, foi o curador da 1ª edição da Flica, de que é fundador e participante da curadoria. É ex-presidente da Câmara Bahiana do Livro – CBaL (gestão 2009/2010). Autor de “História do Brasil vira-lata” (Casarão do Verbo – 2012), tem oito títulos publicados, entre romances, relatos históricos, livro de contos e o Dicionário de Fetiches (2008), obra de referência. Participa de um quadro periódico sobre literatura na rádio Educadora, de Salvador.

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