Natal irrita e deprime quem não está a fim de festa nem tem paciência para compras

 

PapaiNoel2

Regiane Teixeira / De São Paulo

 É tarefa complicada para qualquer um desviar de luzes, propagandas e gente com sacolas em dezembro. Provavelmente dói mais na professora Adriana Bauer, 48, do que em você.

Ela faz parte de um grupo de pessoas que não acha nenhuma graça na risada do Papai Noel e que se sente mais angustiado nesta época. “Fica todo mundo louco para fazer compras, viajar, sair de férias”, diz. “Quem não pensa nisso fica desconectado.”

Os motivos para não se sentir no clima natalino vão desde a irritação pelo excesso de consumismo até o aumento de ansiedade por conta da pressão para ser sociável com familiares, amigos e colegas de trabalho.

 

Ceia magra

Não existe um termo clínico para definir a “depressão de Natal”, mas psicólogos observam um “boom” de reclamações de pacientes no período. “A sensibilidade das pessoas está à flor da pele e, por ser o final de um ciclo, é uma época em que se faz um balanço das expectativas e das relações”, diz o professor de psicologia da PUC-SP Hélio Roberto Deliberador.

Segundo Adriana Rizzo, voluntária do CVV (Centro de Valorização da Vida, ONG que dá suporte emocional por telefone ou internet, muito procurada por potenciais suicidas), os atendimentos disparam entre 23/12 e 1/1.

 

Que venha janeiro 

O Natal de 2012 foi um dos piores para a professora Adriana. Sem filhos, ela havia acabado de perder um cachorro doente. O marido estava desempregado.

“Não achei que tinha algo a comemorar”, diz ela, que já quebrou um dente de tanto rangê-lo, tensa que estava. “Sinto uma pressão quando vejo as pessoas indo ao shopping, pensando no que comprar, gente que nunca imaginei fazendo isso.”

O “blues” natalino “é uma queixa com tendência a crescer, pois as exigências sociais estão maiores”, diz a psicóloga Maria Aparecida das Neves, que atende Adriana há sete anos. “A pessoa pensa que não vai ter dinheiro para presentes, que tem que estar feliz, se sair bem nos eventos sociais.”

Para ela, porém, a maior preocupação é com quem tem depressão. “Imagina alguém que já não consegue fazer as coisas do dia a dia ter que ver a cunhada ou a tia de que não gosta.”

Mas, ainda que a pessoa venha com aquele papo de “prefiro ficar sozinha”, especialistas aconselham a não deixar depressivos sós na data.

O jornalista e músico Bruno Palma, 28, é outro que prefere pular as festas. Até pôs seus sentimentos numa canção.

“Eu quero desaparecer/Eu quero adormecer/E acordar só no próximo ano/Eu não quero fingir/Não quero te deixar para baixo/Voltarei quando isso terminar”, canta em inglês em “Come January” (“venha janeiro”).

Ao menos um alento da psicóloga Maria Aparecida: “O Ano-Novo já é uma data menos problemática. É quando tudo se dilui, se dispersa”.

Fonte: Folha de São Paulo

Festas, luzes, brilhos…

 

Se me perguntarem qual a minha festa preferida direi sem titubear: o São João. Houve um tempo em que a festa junina disputava com o carnaval. Mas, depois que os festejos carnavalescos foram privatizados o São João conquistou um lugar cativo no meu coração. Festa alegre, animada por música descontraída, um convite à dança. Decoração singela, muito colorida e um convite à gula, haja vista a fartura de iguarias regionais. Encontro de filhos, amigos, parentes queridos que moram distante; enfim, festa de alegria.

E o Natal? Acho bonito; gosto das luzes, das ruas iluminadas, dos presépios, que hoje estão quase em extinção, e do encontro entre as pessoas que se querem bem. Detesto ver as ruas e principalmente os shoppings cheios de pessoas apressadas numa ânsia incontida de consumo. Sinto a sensação de estar encurralada e, ao mesmo tempo, prisioneira do trânsito e do brilho que ofusca. Também acho o Natal uma festa triste, quando deveria ser uma festa de alegria, pois se comemora o aniversário de um menino. Mas será que muitas pessoas lembram desse aniversário? Tenho a impressão de que o Natal também provoca tristeza e decepções. O apelo é muito forte! As pessoas sozinhas, doentes ou pobres ficam mais sozinhas ainda, pois ninguém tem tempo para pensar nelas.

Pensando nessas coisas decidi tirar da gaveta um texto que escrevi em 17 de dezembro de 1977 e que ofereci a uma pessoa muito querida, Naidison Baptista, meu professor de Metodologia do Trabalho Científico, na UEFS. Naidison era severo e provocador; ele sempre dizia que nos acomodávamos facilmente e que precisávamos melhorar. Como era fim de ano e como o Natal se aproximava, esse texto foi oferecido ao professor, que para mim era uma espécie de guru. Foi a primeira vez que tive a coragem de revelar publicamente escritos que mantinha engavetados, em segredo, e este gesto significou, também, uma libertação, um jeito de confessar sentimentos e coisas que poderiam ser julgadas. Eu tinha certeza de que Naidison entenderia.

Hoje, 35 anos depois, reencontrei o texto em questão e decidi publicá-lo aqui no blog, sem medo de julgamentos.

 

Mais um conto de Natal

Leni David

Estudava na escola primária e um dia, na hora do recreio, vi uma menina com um boneco. Era um palhaço equilibrista. Quis tocá-lo, mas ela puxou-o para perto de si com um grito: é meu!

O palhaço equilibrista não me saía da cabeça. Menina interiorana, nunca tinha ouvido falar em Papai Noel. Mas, dezembro se aproximava e me contaram que aquele velhinho distribuía presentes na noite de Natal. Disseram-me que precisava escrever uma carta e deixar os sapatos atrás da porta do quarto.

Escrevi uma carta para Papai Noel, uma carta carinhosa, na qual eu contava que passara de ano, que tinha sido bem comportada e um rosário de coisas boas para merecer o presente. Eu queria um palhaço equilibrista!

Até aquele dia eu só conhecia do Natal, o presépio, e a história dos reis magos, que foram guiados até Belém por uma estrela que anunciava o nascimento do Deus Menino. Achava bonito o presépio enfeitado com musgos, pedras, conchas e areia branquinha; achava bonitas as casinhas de papelão e as figuras de barro espalhadas na areia. Na manjedoura, Maria, José, o boi, o burro, os carneirinhos, o galo, a grande estrela dourada e o Deus Menino deitado nas palhas de braços abertos, nu, sorrindo.

Na volta da missa do galo, da qual participava a maioria da comunidade local, um grande incêndio fez da minha rua um inferno; era a maior casa comercial da cidade que pegava fogo. As labaredas medonhas pareciam lamber o céu.

Era Natal e eu queria que as labaredas se dissipassem, que as explosões terminassem, para permitir a passagem do Papai Noel. Era preciso dormir, pois o velhinho só visitava as casas no silêncio da noite, quando todos dormiam.

Acordei cedo e corri na direção dos sapatos que estavam enfileirados atrás da porta do quarto. Estavam vazios; oito pares de alpercatas surradas, todas vazias. Lembro dos olhos grandes de uma das minhas irmãs mais novas, arregalados, interrogadores. Pensei; Papai Noel, certamente ficara assustado com o fogo e odiei aquele incêndio.

O movimento da rua naquela manhã natalina era diferente. As crianças da vizinhança, todas, tinham presentes para mostrar: bolas, petecas, bonecas e até velocípedes!

Por que eu não tinha um palhaço equilibrista?

Lembro das grossas lágrimas que escorriam dos olhos da minha mãe, e é por isso que eu não gosto de você, Papai Noel!

Feira, 17/12/1977.