14 de março – Dia Nacional da Poesia

O filósofo grego, Aristóteles, afirmava que “a arte literária é mimese (imitação); ou seja, é a arte que imita pela palavra”.

A palavra poesia tem origem grega – poíesis – e significa ação de fazer algo, criar. A poesia é definida como a arte de escrever em versos, aquilo que desperta o sentimento, com o poder de modificar ou imitar a realidade, segundo a percepção do artista. No passado os poemas eram cantados, acompanhados pela lira, um instrumento  musical muito comum na Grécia antiga. Por isso, diz-se que a poesia pertence ao gênero lírico. Hoje podemos falar de versos livres, poemas épicos, dramáticos e líricos.

As linhas de um poema são os versos. Ao conjunto de versos dá-se o nome de estrofe. Os versos podem rimar – ou não – entre si e obedecer a determinada métrica, que é a contagem das sílabas poéticas.

Os versos mais tradicionais são as redondilhas; a redondilha menor tem cinco sílabas, e a maior, sete; os versos decassílabos têm dez sílabas; os alexandrinos, doze.

A rima é um recurso utilizado para dar musicalidade aos versos, baseando-se na semelhança sonora das palavras do final ou, às vezes, do interior dos versos.

Rima, ritmo e métrica são características especiais de um poema e que podem variar, dependendo do movimento literário da época. A partir do Modernismo (1922) os versos livres são os mais utilizados.

Segundo o poeta Ferreira Gullar, o artista cria um outro mundo “mais bonito ou mais intenso ou mais significativo ou mais ordenado – por cima da realidade imediata”.

O Dia Nacional da Poesia é comemorado no dia 14 de março em homenagem ao nascimento do poeta baiano Castro Alves.

 Antônio Frederico de Castro Alves nasceu a 14 de março de 1847 na Fazenda Cabaceiras, comarca de  Muritiba, a 42 Km da vila de Nossa Senhora da Conceição de “Curralinho”, hoje Castro Alves, na Bahia, e faleceu a 6 de julho de 1871, na cidade do Salvador, com apenas 24 anos de idade. de Muritiba,  a 42 Km da Vila de Nossa Senhora da Conceição, hoje Castro Alves, na Bahia; ele faleceu a  6 de julho de 2871. em Salvador, com apenas 24 anos de idade.

 Em 1862 ingressou na Faculdade de Direito de Recife. Datam dessa época os seus amores pela atriz portuguesa Eugênia Câmara e a composição dos primeiros poemas abolicionistas. Em 1867 deixa Recife, indo para a Bahia onde faz representar seu drama Gonzaga. Segue depois para o Rio de Janeiro, recebendo incentivos dos escritores José de Alencar, Francisco Otaviano e Machado de Assis.

A 11 de novembro de 1868, em uma caçada nos arredores de São Paulo, feriu o calcanhar esquerdo com um tiro de espingarda, resultando-lhe a amputação do mesmo. Sobreveio, em seguida, a tuberculose, que lhe obriga a retornar à sua terra natal, onde veio a falecer.

Castro Alves pertenceu à Terceira Geração da Poesia Romântica (Social ou Condoreira), caracterizada pelos ideais abolicionistas e republicanos, sendo considerado a maior expressão da época

Suas obras mais destacadas são: Espumas Flutuantes, Gonzaga ou A Revolução de Minas, A Cachoeira de Paulo Afonso,Vozes D’África, O Navio Negreiro, entre outras. Suas poesias são marcadas pela crítica à escravidão, motivo pelo qual é conhecido como “Poeta dos Escravos.

Castro Alves

Poemas de Castros Alves

                   Vozes d’África (fragmentos)

Deus! ó Deus! onde estás que não respondes?  
Em que mundo, em qu’estrela tu t’escondes  
Embuçado nos céus? 
Há dois mil anos te mandei meu grito,  
Que embalde desde então corre o infinito… 
                              Onde estás, Senhor Deus?…
(…)

Hoje em meu sangue a América se nutre  
Condor que transformara-se em abutre, 
Ave da escravidão, 
Ela juntou-se às mais… irmã traidora  
Qual de José os vis irmãos outrora  
Venderam seu irmão.
 

Basta, Senhor!  De teu potente braço  
Role através dos astros e do espaço  
Perdão p’ra os crimes meus!  
Há dois mil anos eu soluço um grito… 
escuta o brado meu lá no infinito, 
Meu Deus!  Senhor, meu Deus!!… 
  
                     (São Paulo, 11 de junho de 1868)
O ‘Adeus’ de Tereza

                   Castro Alves 

A vez primeira que eu fitei Tereza,
Como as plantas que arrasta a correnteza,
A valsa nos levou nos giros seus…
E amamos juntos… E depois na sala
“Adeus” eu disse-lhe a tremer co’a fala…

E ela, corando, murmurou-me: “adeus.”

Uma noite… entreabriu-se um reposteiro…
E da alcova saía um cavaleiro
Inda beijando uma mulher sem véus…
Era eu… Era a pálida Teresa!
“Adeus” lhe disse conservando-a presa…

E ela entre beijos murmurou-me “adeus!”

Passaram tempos… sec’los de delírio
Prazeres divinais… gozos do Empíreo…
… Mas um dia volvi aos lares meus.
Partindo eu disse – “Voltarei!… descansa!…”
Ela, chorando mais que uma criança,

Ela em soluços murmurou-me: “adeus!”

Quando voltei… era o palácio em festa!…
E a voz d’Ela e de um homem lá na orquestra
Preenchiam de amor o azul dos céus.
Entrei!… Ela me olhou branca… surpresa!
Foi a última vez que eu vi Teresa!…

E ela arquejando murmurou-me: “adeus!”

São Paulo, 28 de agosto de 1868.

Publicado no livro Espumas flutuantes: poesias de Castro Alves, estudante do quarto ano da Faculdade de Direito de S. Paulo (1870).

Cezar Ubaldo

 

ENTRE VAZIOS

A noite é devagar,

entre vazios

uma melodia é silenciada

e depois

o próprio mar acaba navegando

e tudo acaba…

A PAZ É UM PÁSSARO

A paz é um pássaro

que desce sobre a minha cabeça.

Um pássaro azul

como o azul de fevereiro…

HOMEM

Envolto,

por grades estrangulado

Não sonho, não canto…

E até mesmo a minha alma de pássaro

chora a liberdade

lá fora…

HOCUS POCUS

Vi

o que séculos não verão:

o vento engravidando

a rosa matinal…

HOCUS POCUS IX

Se a mim fosse permitido fazer um poema

talvez o fizesse para Deus

que nada me pede ou dá.

Quem sabe o fizesse em apenas seis minutos

mas que cada minuto tivesse valor

de um século

para envolver o sono da tarde

e celebrar os encontros noturnos do mar…

Cezar Ubaldo por ele mesmo:  Sou poeta, professor, pedagogo, homem de teatro, mesmo sem estar no palco. Convivo com homens da Hera.  Mas a minha hora, na Hera, não se consumou.Tenho música no disco “Cidadão do Mundo”,de Fernando Lona, o único. Escrevi argumentos para o super 8mm quando havia o Clube de Cinema na minha cidade. Dirigi “As Criadas”,de Genet; escrevi e dirigi “O jogo dos bonecos de carne”; dirigi, de Pessoa, “O Marinheiro”, honra e glória. Sou visto, não tenho quistos. Sou saúde plena.Vivo a minha hora e aos amigos, de antes e d’agora, abro os braços e os enlaço, sem marcas ou ilusões. Ah, ainda tem:”Liberdades do Homem”,”Poemas de Bem querer e outros Quereres” e a Stitientibus, em dois volumes.

Dival Pitombo

 

                  Germinal

Na sombra do parque feliz

goteja o luar

cheirando a madressilva.

E o orvalho,

que viajou na cauda do vento,

mitiga a agonia dos girassóis

e fecunda o poema.

Rua Conselheiro Franco

Dival da Silva Pitombo (07/07/1915 – 03/07/1989) nasceu em Feira de Santana. Dedicou-se ao magistério, às letras e às artes, embora tivesse formação em odontologia. Foi professor de História e dirigiu o Instituto Educacional Gastão Guimarães; também fundou e dirigiu o Museu Regional de Feira de Santana e a Associação Feirense de Arte. Foi membro do Conselho Estadual de Cultura, sócio do Instituto Histórico e Geográfico da Bahia, da Associação Baiana de Imprensa, do Centro de Artes Plásticas do Nordeste, da Academia de Letras de Feira de Santana, da qual foi Presidente.

Dival da Silva Pitombo promoveu e incentivou os principais acontecimentos artísticos e culturais da cidade. Ao lado de Odorico Tavares, fundou o Museu Regional de Feira de Santana, contando com o apoio de Assis Chateaubriand. Além de membro do Conselho Diretor da Fundação Universidade de Feira de Santana e Diretor de Vida Universitária, fez parte do Conselho Editorial da revista da UEFS, Sitientibus, onde publicou poemas e contos. Como romancista, escreveu o romance Beco do Mocó, ainda inédito. Como poeta publicou em revistas e jornais culturais e em 1984 publicou o livro Litania para o Tempo e a Esperança.

            Os flamboyans estão floridos

A chama vegetal
devorando o verde.
Orgia rubra
agredindo a paz deste crepúsculo.
Poinciana régia.
Flor do Paraíso.
Labaredas de Sol
crestando ninhos.

Os flamboyants estão floridos!
Verde e escarlate,
mais escarlate que verde.
É como um incêndio no mar!
Na multidão indiferente
apenas a criança olha.

Os flamboyants são para os pássaros!

Homens práticos,
parai vossos computadores.
Mágicos, poetas,
sacerdotes,
homens públicos
e mulheres publicadas.

Vagabundos,
viciados e ladrões,
e lânguidas prostitutas
que investis na noite
o ouro das vossas vidas,
esquecei por um instante
a vossa loucura.

E correi, de mãos dadas,
para a praça.
Vinde olhar o céu,
que há um jardim de fogo
plantado no azul.

Os flamboyants estão floridos!

                         (Dival Pitombo)

 Foto: Leo Brasileiro

Um dia ainda vou viver de brisas

                                       p/Affonso Manta

 Um dia ainda vou viver de brisas.

Vou colher nuvens no meu quintal

e conversar com as plantinhas tenras

bobagens só bobagens.

Um dia vou me embrenhar em matos leves

e me deter a olhar só passarinhos.

Vou escrever poemas sem assunto

e viver sonhos sem cor e sem assombros.

Um dia

vou convidar os amores nunca tidos

para gozar uma noite muito clara.

Vou gargalhar das anedotas sem graça

e chamar de irmão todo mundo

 como São Francisco.

                          (Antônio Brasileiro)

 

Antônio Brasileiro – “Poeta e pintor: é assim que Antônio Brasileiro gosta de se definir. Mas não são essas poucas palavras que melhor o definem. Nome expressivo  da poesia brasileira atual, ensaísta e ficcionista, Brasileiro é também figura de destaque como agitador cultural. Mente multifacetada, seu raio de ação inclui, além da literatura e das artes plásticas, um sólido estudo de filosofia. Com vinte e duas obras publicadas (poesia, ensaio, conto, romance, teatro), divide o resto do tempo entre o amor pelos livros, a música e a prática do tênis.”

Antônio Brasileiro: o avesso do poeta de olhar distraído e jeito esquivo

Por Leni David

Conheço Antônio Brasileiro desde os anos 70, quando era professor do Colégio Estadual de Feira de Santana e eu apenas uma professorinha iniciante. Ele chegava devagar, olhar distraído, cabelos longos, óculos à la John Lenon e sandálias franciscanas, usadas com meias. Sentava-se na sala dos professores e era de pouco conversava, preferia ler. Mas eu sabia que ele era o poeta, o criador da revista Hera. Seu jeito era calado e esquivo.

Nos anos 80, ainda como estudante da UEFS, participei de alguns colóquios e seminários sobre a revista Hera e seus poetas. A partir daí, os contatos foram mais freqüentes, mas não existia, ainda, entre nós, uma amizade sólida; esta só se concretizou nos anos 90, quando Brasileiro foi convidado a participar de um Congresso em Paris; eu morava lá.

Em 2004 criei o “Projeto Santos da Casa”, na UEFS; Brasileiro completaria sessenta anos e por sugestão de Cid Seixas, ele foi o primeiro homenageado. Organizamos o colóquio As multifaces de Antônio Brasileiro cuja proposta era reunir intelectuais, professores e estudantes da universidade, para homenagear o “santo da casa” que completaria 60 anos. Este, além de professor e escritor, trazia consigo uma vasta bagagem como poeta e artista plástico; além disso ele havia sido o fundador das revistas literárias Serial (Salvador) e Hera (Feira de Santana) e do Projeto Chocalho de Cabra (artes plástica). Enquanto autor de uma obra singular, artífice de novas propostas estéticas e visto como um expressivo agitador cultural, conseguiu-se retraçar a sua trajetória, discutir e analisar criticamente a sua obra e o Colóquio foi  um sucesso.

Nessa época entrevistei Brasileiro – até o presente ele não teve ocasião de ler ou ouvir essa entrevista – e recolhi informações inéditas, das quais publico alguns fragmentos, para homenagear o amigo, pelo avesso, perfil que muito aprecio.

LD : Quem é Antônio Brasileiro?

A B – De vez em quando eu gosto de dizer que a coisa mais importante no mundo –  eu sou um cara da linha de Epicuro – é conversar, reunir amigos; eu acho que a amizade é uma coisa muito importante. Eu sou essa pessoa que gosta muito de conversar… de ter um jardim. Agora, quem é Antônio Brasileiro, aí eu concordo com as definições de Roberval (Pereyr) sobre mim. Eu acho que sou um camarada meio complexo e talvez umas poucas definições talvez não fossem suficientes… eu gostaria de ser simples, mas cada vez mais eu vou descobrindo que ser simples é de uma complexidade absurda! É muito difícil.

LD – Você é polêmico, provocador? Dizem que você é tão amado quanto odiado…

AB – Na verdade… eu sempre achei que eu era 90% amado e só 10% odiado e ainda continuo achando, mas não entendo nada de matemática, de estatística… Mas, como vocês estão dizendo eu atribuo isso ao fato de ser independente, de ter a minha maneira própria de pensar; e quando a gente tem suas próprias idéias, pensa com os próprios pés (risos)… Então, para conseguir chegar ao lugar que a gente quer, a gente acaba incomodando, não é? O fato é que existe a antiga luta entre indivíduo e a sociedade. Desde os 15 anos de idade eu era leitor de filosofia… então, eu sempre respeitei a individualidade. Eu acho que as pessoas que eu mais respeito são aquelas que têm mais individualidade. As pessoas que eu amo, que eu admiro, são pessoas que são polêmicas por natureza… eu acho que tem que haver gregos e troianos e acho bom que seja assim, e é importante que seja assim. Eu acho que a liberdade passa por essa condição de ser amado e de ser odiado… se eu fosse morno, não seria nem amado, nem odiado.

 

LD: Agora responda rapidamente:

Uma cor – As cores do arco-íris

Um perfume – Cheiro de mato

Uma flor – Rosa

Um animal – Dois: Gato e galo

Um poeta: – Dois: Drummond e Pessoa

Um livro – Don Quixote de la Mancha

Música – Três: Sinfonia n0 9 de Bhetoven, o Réquiem de Mozart e as canções de Chico Buarque

Comidas preferidas – Legumes e carne do sol

Cidades – Rio de Janeiro e Paris

Um desejo – Viver uma vida calma

Um sonho – Ter meus livros publicados por uma grande editora

Uma realização – O Grupo Hera – Minha maior criação e motivo de muito orgulho.

 * – Texto publicado originalmente no Caderno Cultural do Jornal A Tarde (Salvador – BA) em 13/06/2009, p. 6.