Festa do Bonfim – Alegria, devoção e protesto

                                                  Foto: Raul Spinassé 

Nesta quinta-feira, 17, após o Culto Ecumênico realizado em frente à Igreja de Nossa Senhora da Conceição da Praia, padroeira de Salvador, uma queima de fogos iniciou a caminhada dos fiéis em direção à Colina Sagrada, onde fica localizada a Igreja do Bonfim. Dezenas de baianas puxam o cortejo de baianos, turistas e autoridades até a Igreja. Cerca de 34 entidades culturais, entre bandas de sopro, afoxés, grupos de samba e percussão, além dos 1.500 integrantes do Bloco Afoxé Filhos de Ghandy, desfilam pela Cidade Baixa.

O culto reuniu milhares de fiéis que desde o início da manhã desta quinta-feira, 17, aguardavam em frente à Conceição da Praia, no Comércio. Participaram da cerimônia representantes de diferentes religiões, entre católicos, evangélicos, mulçumanos, espíritas e do candomblé, além políticos e autoridades locais, como o governador em exercício, Otto Alencar, do chefe da Casa Civil, Rui Costa, da senadora Lídice da Mata e do prefeito de Salvador, ACM Neto.

                                                        Foto: Eric Salles

 “Quem tem fé vai a pé”

Além de preparo físico, é preciso fé para enfrentar o percurso de oito quilômetros, da Conceição da Praia à Colina Sagrada. O cortejo tem início após a celebração do culto inter-religioso. São quase três horas de uma peregrinação que segue o fluxo da Rua Miguel Calmon, no Comércio, encontra a Avenida Jequitaia (Calçada) e converge na Avenida Fernandes da Cunha (Mares). Na reta final, a Avenida Dendezeiros é o caminho para a multidão chegar à igreja ao som de bandinhas, conjuntos de percussão e muito samba.

Estrutura

Para receber a multidão de devotos e turistas que acompanham a lavagem, os poderes públicos municipal e estadual prepararam um esquema especial de trânsito e transporte, saúde e segurança. Por parte da Secretaria da Segurança Pública, cerca de 1.900 policiais (1.811 militares e 85 civis) vão assegurar a tranquilidade no cortejo. São três postos da Polícia Civil e 38 postos elevados de observação da Polícia Militar (PM).

A Secretaria Municipal da Saúde (SMS) montou três postos (Conceição da Praia, Estação da Calçada e Colina Sagrada). Duas ambulâncias também estão de prontidão para casos graves .

Políticos testam popularidade na festa do Bonfim.

A tradicional Lavagem do Bonfim será marcada, nesta quinta-feira, 17, pela estreia de ACM Neto (DEM) como  prefeito de Salvador  na festa religiosa e pela ausência do governador Jaques Wagner (PT), que está em viagem à China.

Manifestação de fé, mas que serve de palco para testar a popularidade dos políticos, a caminhada funciona como um termômetro tanto para Neto medir a avaliação dos 17 primeiros dias de sua gestão, como para Wagner auferir os seis anos de seu governo, o qual estará no comando até 2014.

Wagner, que só retorna à Bahia na próxima terça-feira, vai escapar de ser acusado de “pecador” pelos servidores do Estado. No 7 de Setembro de 2012 o governador também agendou uma viagem à Espanha e Singapura (Ásia) e se livrou das vaias dos professores e dos policiais – categorias que comandaram as duas maiores greves, no ano passado, contra o governo do petista. Desta vez, as críticas vão sobrar para o vice-governador Otto Alencar (PSD), que estará representando Wagner na Lavagem do Bonfim. Disposição é o que não falta aos servidores. “Vamos denunciar ao Senhor do Bonfim que o governador não paga a URV dos funcionários”, avisa a coordenadora da Federação dos Trabalhadores Públicos do Estado da Bahia (Fetrab), Marinalva Nunes.

Para os 43 vereadores eleitos em outubro será a chance de reencontrar o eleitor e ratificar os compromissos de campanha eleitoral. Quanto aos que estão mirando a eleição de 2014, não custa nada pedir, desde já, as bênçãos do Senhor do Bonfim.

 Fonte: Com informações do jornal A Tarde online.

Observação: Publicarei ainda hoje a história da Lavagem do Bonfim, da origem aos nossos dias.

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Universidades Estaduais da Bahia – Manifestação dos docentes na Lavagem do Bonfim

O Movimento Docente (MD) das Universidades Estaduais da Bahia (Ueba) continua realizando mobilizações como parte da campanha salarial de 2012, cuja pauta foi protocolada junto ao governo em junho do ano passado. Nesta quinta (17), vão realizar uma manifestação na tradicional Lavagem do Bonfim para denunciar a condição de piores salários pagos aos professores entre as Universidades estaduais nordestinas. A concentração será às 8h, em frente ao Elevador Lacerda.

Vestindo as camisas da campanha salarial, que trazem as principais reivindicações do movimento, e portando faixas, pirulitos, balão e cartazes, ao som de uma banda de fanfarra, os professores irão denunciar a política de descaso do governo com as universidades estaduais, em particular o estrangulamento orçamentário das Ueba e a desvalorização do trabalho docente.

As mobilizações ganham mais força principalmente porque a Mesa de Negociação com o governo sobre a incorporação do restante da CET, instalada em 8 de janeiro deste ano, e a discussão do reajuste salarial de 28% precisam ser aceleradas, pois existe um indicativo de greve para ser avaliado nas assembleias das quatro universidades no início de abril.

Segundo a diretoria da Adufs, a participação nas festas populares da Bahia é muito importante para dar visibilidade à luta dos professores, além de manter um diálogo com a população baiana e contribuir para que o Movimento Docente se fortaleça ainda mais.

Para os que residem em Feira de Santana, a Adufs disponibilizará transporte. Os veículos sairão da Uefs, em frente ao Módulo IV, às 6h30, retornando de Salvador às 15 horas. O DCE e o Sintest também estão convidados a participar da manifestação.

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Os poetas de Feira de Santana

 

Comentário de Affonso Romano de Sant’Anna na Radio Metrópole (BA), em 4/1/2013

 

Já estive uma vez em Feira de Santana fazendo conferências, mas não podia supor que ali havia uma insólita revista literária – Hera – e um consistente grupo de poetas . Agora o reitor da Universidade Estadual de Feira de Santana Jose Carlos Barreto de Santana acaba de editar um grosso volume, mais de 700 páginas, fazendo-nos conhecer esses poetas agrupados entre 1972 e 2005.

Isto é o que se chama “diferença”. Tudo começou quando Antonio Brasileiro foi em `1967 lecionar Moral e Cívica no Colégio Estadual de Feira de Santana. Transformou a chatura daquela disciplina imposta pela ditadura em algo atrativo. Fez um concurso de redação, selecionou os aspirantes a escritor trabalhou com eles os textos que deram origem à revista “ Hera. Resultado: apareceu ali geração de poetas. Alguns surpreendentes. O leitor Nivaldo Moura, sempre atento, descobriu que havia até uma tese de Jecilma Alves Lima sobre esses poetas baianos. Tese que li e apreciei.

Essa publicação dos poetas de “Hera”, me lembrou dos antigos cancioneiros medievais que reuniam o melhor de uma época. Também nesta edição história de “Hera” são dezenas de poetas, uma safra significativa. Recebi o volume através de Roberval Pereira, poeta e teórico que sabe das coisas. Botei no facebook uma noticia dessa publicação e gostaria que os jornais do Rio e São Paulo acordassem, porque essas antologia de “Hera é imprescindível à historia da moderna poesia brasileira. No livro “Musica Popular e moderna poesia brasileira” estudei os grupos dominantes na poesia brasileira, mas a poesia brasileira não se limita àqueles grupos vanguardistas que se digladiavam naquela época. O crítico piauiense Assis Brasil mostrou isto numa série de antologias.

Gostei de saber que a geração mais velha de poetas baianos, como Ruy Espinheira e Florisvaldo Mattos deram força a esse movimento nascente. Tanta bobagem passando por poesia é publicada com destaque na imprensa do Rio e São Paulo, que ler esses poetas de “Hera” é um refrigério.

A poesia é um mistério. Ela sopra onde quer. Enquanto alguns zumbis perdidos na pós-modernidade ficam alardeando a morte da arte e a morte da poesia ela surge generosa, jovem e necessária. Como nesses poetas de Feira de Santana.

 

Observação: Agradeço particularmente à minha amiga Alana Freitas pelo envio da notícia. O comentário de Affonso Romano de Sant’Anna me deixou muito feliz. Sou fã do grupo desde os anos 70 e vibrei com a publicação da Antologia do Grupo Hera no ano passado; em minha modesta opinião, um documento histórico. Esta alegria é ainda mais forte, pois a minha cidade – Feira de Santana – está na origem de tudo. Parabéns aos poetas de Feira de Santana!

Ps. Aproveitei para publicar fotos dos jovens poetas.

Atualização: Recebi do poeta Iderval Miranda  mais três fotos dos jovens poetas da Hera, provavelmente dos anos 70 (as calças “boca de sino” e os os cabelos black-power atestam isso), para o “meu baú”. Muito obrigada Iderval!

 

Um grande homem, um amigo inesquecível: Bira

 

Vamos lembrar sempre do sorriso largo desse intelectual do povo

Patrícia Moreira*

 

O momento é de pesar, mas, certamente, Bira, como todos os seus alunos, amigos e colegas chamavam o mestre Ubiratan Castro de Araújo, certamente tiraria da manga uma pilhéria inteligente sobre os desígnios da morte, como que a desdenhar, ou a acreditar que por trás dela haveria algo de bom. E a despeito da perda e da saudade, é preciso, mais do que nunca, honrar seu nome e fechar este ciclo, lembrando um pouco de quem foi este homem de sorriso largo, que  partiu para longe nestes primeiros passos de um novo ano.

Conheci Bira, ainda menina, quando ele fazia doutorado na França, por intermédio de minha mãe, Leni David; ambos alunos da também saudosa professora Kátia Mattoso. Anos depois, em 1999, quando ensaiava entrar no Mestrado em História da Ufba, tive o privilégio de ser aceita como aluna especial na turma da disciplina Escravidão e Liberdade, que o professor Ubiratan Castro de Araújo ministrava.

Aulas

Ali, a História (com H maiúsculo), me conquistou de vez. Nas deliciosas aulas do professor Bira, ele sempre recheava os acontecimentos históricos com alguma curiosidade sobre os personagens, ou relatava detalhes pitorescos que davam às suas quatro horas de aula um toque diferente, que nos levava a esquecer do tempo.

Nesta ocasião, tive a honra de ler e traduzir, como trabalho acadêmico, alguns capítulos de sua tese de doutorado, sobre a economia escravagista na Bahia, dois volumes de mais de 600 páginas, escritos em francês, que, salvo engano, continuam inéditos. Do seu trabalho foi publicado A Guerra da Bahia: uma narrativa histórica sobre o processo de conflito social, econômico e racial que aconteceu em Salvador e no Recôncavo entre os anos de 1820 e 1823. Trata-se de textos extraídos da sua tese de doutorado que  integram a série de publicações” Capítulos”, lançada pelo Centro de Estudos Afro-Orientais da Universidade Federal da Bahia e reeditada pela Fundação Gregório de Mattos (da Prefeitura de Salvador), com o objetivo de valorizar a importância da participação popular negra na independência do Brasil,  nos quais retratava de modo particular os acontecimentos do 2 de Julho.

Lutas

Naquelas páginas, a participação dos negros nas lutas pela Independência da Bahia ganharam uma luz especial, contada também de uma forma singular, pois ele também tinha um jeito original de contar a História oficial.

Aliás, Bira não contava, vivia a História. Todos os anos, quando tive a oportunidade de acompanhar o 2 de Julho, lá estava ele desfilando seu entusiasmo pelas ladeiras do Pelourinho, saudando a memória do Batalhão dos Periquitos.

Além do ser querido e amigo, do seu papel como mestre de algumas gerações de historiadores, Bira também tinha seu lado militante, em defesa da cultura afrobrasileira. Mais uma vez, era um militante diferente, destes que dispensam clichês e bandeiras.

Fundação Palmares

À frente da Fundação Palmares, que presidiu nos primeiros anos do governo Lula, e depois à frente da Fundação Pedro Calmon, fez valer sua origem negra ao desenhar e tocar projetos que valorizavam a africanidade da nossa gente. Foi um militante ímpar. Dispensava os radicalismos dos movimentos negros e trabalhava no dia a dia pelo reconhecimento de um legado cultural, pela valorização do negro na sociedade e pela repartição do bolo social.

Bira também levou seu jeito bonachão para a sisuda Academia de Letras da Bahia e escreveu um livro, Histórias de Negro, que sintetiza sua luta e prova aquilo que ele sempre buscou em toda a sua vida: contar a história do povo da Bahia, sob a ótica do negro. Reação à opressão.

Sabedoria

Por tudo isso e muito mais, a velha cidade da Bahia, como ele gostava de dizer, ficou mais vazia, mais triste; perdeu um intelectual e um homem do povo. Bira leva consigo uma sabedoria de vida por fazer as coisas acontecerem de um jeito inusitado. Deixa-nos sua sabedoria acadêmica, sua obra, que ainda está para ser revelada para os historiadores de hoje e de amanhã.

*Patrícia Moreira é jornalista e mestre em História pela Ufba.

Fonte: O texto foi publicado originalmente no Jornal A Tarde de 04/01/2013, p. 7.

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Ano Novo!

 

Idmar Boaventura

Bendito seja Janeiro,

que nos dá a chance de começar             de          novo.

Dezembro é crepúsculo. Tem gosto

de coisas velhas guardadas na gaveta

com as luzinhas da árvore de natal.

Dezembro, mês de balanço,

é cansaço, desencanto.

O que não se fez. O que não se cumpriu.

O que poderia ter sido.

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Mas quando Janeiro, menino,

desponta  no horizonte,

com sua roupa branca e cheiro de mar,

tudo se renova:

aquela dieta, o guarda-roupa, desencontros, amores:

tudo que havemos de ser,

ainda que não seja.

E assim, ano          a           ano,

Janeiro nos rejuvenesce,

com sua porção generosa

de esperança.

A lua cheia (sobre a Baía de Todos os Santos) vista de Itaparica; ao fundo, as luzes de Salvador.

Fonte: Dissonâncias no espelho – aqui