A cobra e o vaga-lume

Leni David

De vez em quando saio navegando pela internet em busca de notícias, novidades e inspiração para o bloguinho; hoje descobri uma crônica muito bonita escrita por Maria Stella de Azevedo Santos, a querida Mãe Stella, do Ilê Axé Opô Afonjá e que foi publicada no blog Mundo Afro.  .

O texto despertou a minha atenção, pois ele trata da inveja, esse sentimento que quase sempre atribuímos ao outro. Mãe Stella, de uma maneira simples e sábia, esclarece alguns aspectos relacionados a esse sentimento considerado nocivo. Segundo ela, devido a sua função no Ilê Axé Opô Afonjá, pessoas de idades, raças e credos diversos, a procuram porque se sentem invejadas; mas, por incrível que pareça, nunca, nem uma vez sequer, alguém a procurou para se libertar do sentimento da inveja.  Então ela questiona: “Será que só existem invejados? Onde estarão os invejosos?” 

Ora se o sentimento existe, é identificado e disseminado, por que somente os invejados procuram ajuda? Os invejosos jamais se arrependem? Ou será que os invejosos são incapazes de se autoavaliarem? Segundo a Ialorixá certas pessoas ficam enfurecidas quando o oráculo anuncia que os problemas apresentados não são decorrentes da inveja. E afirma que, na maioria das vezes, essas pessoas são profundamente inseguras, o que gera uma necessidade de auto-valorização. Logo, seria importante que cada pessoa observasse o seu eu interior e fizesse um esforço para identificar o grau de inveja que existe dentro de si. Dessa forma ela poderia tentar controlar, ou mesmo eliminar este sentimento pernicioso, o que evitaria uma interferência negativa na vida do seu semelhante e, sobretudo, na sua própria vida, pois qualquer energia que emitimos reflete em nós mesmos em primeiro lugar.

E o melhor é que a velha senhora mostra, numa pequena historinha que transcrevo abaixo, a verdadeira face da inveja:

“Uma cobra deu para perseguir um vaga-lume, cuja única atividade era brilhar. Muito trabalho deu o animalzinho brilhante à insistente cobra, que não desistia de seu intento. Já exausto de tanto fugir e sem possuir mais forças o vaga-lume parou e disse à cobra: – Posso fazer três perguntas? Relutante a cobra respondeu: – Não costumo conversar com quem vou destruir, mas vou abrir um precedente. O vaga-lume então perguntou: – Pertenço à sua cadeia alimentar?- Não, respondeu a cobra. – Fiz algum mal a você? – Não, continuou respondendo a cobra.- Então por que me persegue? – perplexo, perguntou o brilhante inseto. A cobra respondeu: – Porque não suporto ver você brilhar, seu brilho me incomoda.”

A fábula da cobra e do vaga-lume, que eu não conhecia, mostra muito bem a mesquinhez daqueles que se incomodam com o brilho alheio, mesmo um brilho singelo. A cobra é poderosa, embora seja asquerosa; com uma picada ela pode destruir a vida de um ser humano. O vaga-lume, na sua infinita insignificância, apenas alegra olhos distraídos. A própria Mãe Stella chama de ingênuas as pessoas que se acreditam ofuscadas pela luz emitida pelo seu semelhante. Segundo ela, cada um possui o seu brilho, que deve estar sempre em harmonia com a sua função. Existem até pessoas cujas funções requerem simplicidade, onde o brilho natural só é percebido através do reflexo do olhar do outro.

E ela lembra ainda de uma senhora coberta de joias que insistia em afirmar que as pessoas a olhavam com inveja. Incomodada pelas queixas a Iarorixá retrucou: “quem não quer ser visto, não se mostra”.

A nossa escritora encerra o seu texto explicando que a inveja é popularmente conhecida como “olho gordo”. Assim, se não queremos ser atingidos pelos “maus olhos” do outro, devemos cuidar para que nossos olhos emagreçam, senão eles ficam tentados a desejar o alheio. E ela adverte: Já que fazemos dieta para que nossos corpos fiquem saudáveis, devemos também fazer dieta para os nossos olhos, pois eles refletem a beleza da alma. A tendência agora é, portanto, olhos magrinhos, mas não anoréxicos, pois alguns desejos eles precisam ter, de preferência, desejos saudáveis.

 Mãe Stella

Dia 11/11/11

 

Em 1 de fevereiro de 2011, publiquei aqui no blog uma informação que recebi por e-mail, e que chamei de Curiosidade.  Aqui está ela:
 “Em 2011 várias datas serão formadas pelo número 1. A primeira, 1/1/11; a segunda, 11/1/11 (as duas aconteceram no mês de janeiro). Agora falta o mês de novembro:1/11/11 e 11/11/11.
Mas não é tudo! Se você somar os dois últimos dígitos do ano em que você nasceu e a sua idade neste ano de 2011, o resultado será 111.
Ex: 85 (ano de nascimento) + 26 (idade em 2011) = 111. Experimente, o resultado será sempre o mesmo! ALGUÉM EXPLICA?”

Hoje, 11 de novembro de 2011 (11/11/11) encontrei na internet diversas versões para o
fato; entre elas, selecionei um texto do Yahoo notícias que publico abaixo:

“Os numerólogos esperam com ansiedade esta sexta-feira, 11 de novembro de 2011.  Quando faltar 49 minutos para o meio dia, o relógio marcará 11H11 do 11/11/11,  um raro número que, para os adeptos das ciências ocultas, pode indicar a  ocorrência de eventos incomuns.

Para a maioria das pessoas é apenas uma coincidência de relógio e calendário que
acontece uma vez a cada 100 anos, mas numerólogos e esotéricos procuram sinais
do que isto pode significar.

Alguns acreditam no início de um humanismo renovado, de uma nova harmonia no mundo, a abertura de um portal para outra dimensão ou até, uma revolução da consciência.

Centenas de aficionados pelas ciências ocultas planejam se reunir neste dia para  cerimônias e danças. Várias páginas dedicadas a esta data apareceram no  facebook. A Organização Nacional dos Cegos Espanhóis (ONCE) organizará uma loteria especial  com um prêmio de 11 milhões de euros.
Os médiuns e sacerdotes paranormais mais renomados comentaram sobre a importância  da sincronia das 11h11 do dia 11/11/11 como o israelense Uri Geller e o americano Solara.
Fanáticos do “Spinal Tap”, um filme de 1984 baseado em fatos reais e imaginários que descreve uma banda de hard rock e onde o número 11 tem um significado especial, também ressaltaram essa importância. “Ter um triplo número em uma data é, sem dúvida, de grande importância”, disse  Solara à AFP. “Vejo uma grande mudança na consciência do planeta e isto  coincide com a data”, acrescentou o médium.
Solara vive no Peru e mantém em segredo seus planos para o dia 11/11/11. Ele revelou que grupos em mais de 50 países vão aproveitar a ocasião para sentar em  silêncio e meditar.
Alguns numerólogos atribuem ao número 11 poderes paranormais que criarão um canal de comunicação com o subconsciente. Outros sustentam que o número representa a dualidade do bem e do mal na Humanidade.
Na internet, blogueiros insistem no caráter místico do 11, que segundo eles pode  estar associado aos desastres como os ataques do 11 de setembro de 2001 nos  Estados Unidos.

Vida volátil

 

João Ubaldo Ribeiro

Fico escrevendo aqui umas coisas meio paranoicas sobre a evolução tecnológica e aí concluo que me explico mal, porque tem gente que pensa que sou um tecnófobo reacionário, que gostaria de escrever com pena de ganso. Grave injustiça. Fui dos primeiros escritores brasileiros a usar computador para escrever, tripulando um clone nacional (e ordinário) de um Apple II, sem disco rígido e com 148 KB de memória, dos quais o editor de texto comia 120. Com sua tremenda impressora matricial, fazia sucesso e eu recebia visitas turísticas a meu escritório. Sempre gostei de novidades tecnológicas e claro que não sou, nem adianta ser, contra essas novidades.

Meu problema não é com tecnologia, é com certos usos que podem fazer dela. Considerando a geral natureza do ser humano, que, agora mesmo, está se matando ferozmente em várias partes do mundo, esses usos, como alguns que já mencionei aqui, às vezes me metem medo. E, se a tecnologia nos beneficia de incontáveis formas, não devemos esquecer como ela é também usada para o mal e para objetivos odiosos e como pode afetar nossa vida para pior, em termos humanos e sociais.

Além disso, nesta longa estrada cibernética que percorri e continuo a percorrer, tenho tido de me adaptar a mudanças cada vez mais rápidas, que cansam até mesmo alguns viciados em comprar todas as versões do iPad. Nos Estados Unidos, quando computador aqui ainda se chamava “cérebro eletrônico”, cheguei a estudar a linguagem Fortran e trabalhar com um computador que, num ambiente refrigeradíssimo, ocupava todo um andar de um prédio da universidade e era infinitamente menos poderoso que meu notebook de um quilo e pouco.

De lá pra cá, até dá para começar a enumerar as novidades que foram aparecendo, mas hoje ninguém mais pode fazer isso sem recorrer ao Google. A mudança é o tempo todo. E está certo que tudo neste mundo é passageiro, inclusive ele próprio, mas acho que o homem gosta de ter algum senso de permanência, de duração. Antigamente era possível reservar tempo para nos acostumarmos às mudanças, mas hoje esse tempo não existe mais e já é piada conhecida dizer-se que o tempo que economizamos com os novos gadgets é necessário para que possamos aprender a usar os novíssimos.

Lembro-me de um velho porta-retratos na casa de meus pais, com uma foto em preto e branco de meu avô paterno, que ficou lá por mais de cinquenta anos. Havia algo de permanência naquela antiga moldura de madeira e no sorriso do velho, havia um certo sossego, coisas que duravam e eram guardadas “para sempre”. No futuro, acho que não se conhecerá mais essa sensação. Os porta-retratos agora são eletrônicos e programáveis para fazer exibição de slides, mudar a foto periodicamente, tocar música e mais outras coisas. As fotos, que hoje se produzem com uma abundância inadministrável, também não são mais para ficar, nada mais é para ficar.

A maior parte das novidades dura apenas dias e ninguém se lembra delas depois. Aliás, ninguém se lembra de mais nada e a fama às vezes já nem alcança os 15 minutos de Andy Warhol, vai embora literalmente em menos tempo, como acontece com muita gente enfocada em reportagens de televisão. Nossa efemeridade, sempre um pouquinho desagradável de lembrar, não tem mais sua sensação aliviada de quando em vez, ela agora se mostra em toda parte e todo o tempo, nada dura nada e os registros são voláteis. Toda a civilização digitalizada é volátil – e, aliás, governos como o americano conservam seus dados preciosos em papel, método de armazenamento mais confiável que circuitos integrados ou memórias eletrônicas de qualquer natureza.

Todo mundo saberá ler e escrever, num mundo de mensagens instantâneas? Talvez não. Não me refiro a escrever à mão, com lápis ou caneta. Hoje já tem quem escreva uma página digitando com os polegares e não rabisque três linhas com uma caneta. Mas estou pensando em leitura e escrita sem o uso do alfabeto. De vez em quando, sou tentado a crer que as futuras mensagens instantâneas, torpedos e similares, serão grafados mais ou menos com ideogramas simples – imagens como aquelas carinhas Smiley que aparecem em milhares de aplicativos, acrescidas talvez de uma ou outra palavra abreviada em letras. De escrever e ler usando alfabeto e sintaxe, como hoje ainda fazemos, não haverá necessidade para grande parte dos usuários de aplicativos de mensagens. Passaremos mais ou menos para hieróglifos simples, que deverão ser perfeitamente adequados ao vocabulário e ao universo de interesses desses usuários. E talvez os que saibam ler e escrever usando o alfabeto venham a constituir uma categoria especial na sociedade, como eram os escribas da Antiguidade.

 Fazer conta, então, nem pensar. Não acredito que na escola ainda se aprenda a tirar raiz cúbica na munheca, como no meu tempo (eu nunca aprendi). Aliás, não acredito na sobrevivência da tabuada – e não me refiro àquelas tipo 7 vezes 8, de que a gente não lembrava na época e até hoje não lembra. Quem, num futuro não muito distante, responder quantas são 6 vezes 9 sem consultar a calculadora será levado para estudos num instituto de neurologia e proporão que se conserve seu cérebro depois da morte. É nesse tipo de coisa que penso, quando falo em tecnologia, não é contra a tecnologia. Será bom para nós não sabermos mais escrever nem fazer contas e deixar fantásticas aptidões naturais, como a memória, irem se perdendo por falta de uso e exercício? Será realmente bom que tudo seja descartável e não dure mais que poucas semanas, nesta vida cada vez mais volátil?

Fonte: O Estado de São Paulo, 09/10/2011